Noticias
Pesquisadores e indígenas apostam na tecnologia para salvar línguas ancestrais
29 de Outubro de 2025 as 07h 59min
Ferramenta bilíngue é desenvolvida com participação ativa dos povos Bororo e Makurap
Um projeto que une tecnologia e transmissão de saberes pretende contribuir para a revitalização das línguas em risco dos povos indígenas Bororo, no Mato Grosso, e Makurap, em Rondônia. O aplicativo chamado 'Bilingo' foi criado para registrar vocabulários, frases e narrativas nas línguas maternas desses povos e ajudar a repassar esses ensinamentos para novas gerações.
A iniciativa envolve pesquisadores no Brasil e na Alemanha, professores e jovens indígenas. Gustavo Poletti, desenvolvedor do sistema, explica que o objetivo é que professores das próprias comunidades indígenas possam acessar a tecnologia para criar e distribuir o aprendizado.
Os Makurap, que habitam Rondônia, estão localizados nas Terras Indígenas Rio Guaporé e Rio Branco e pertencem à família linguística Tupari, do tronco Tupi. No fim da década de 1990, eles ainda falavam a língua, mas hoje ela é usada principalmente por pessoas mais velhas.
Já os Bororo chamam a própria língua de Wadáru, classificada por linguísticas como parte do tronco Macro-Jê, segundo o Instituto Socioambiental (ISA). Eles estão em Mato Grosso.
O Censo 2022 do IBGE aponta que o Brasil tem 295 línguas indígenas catalogadas, presentes em cerca de um quinto dos municípios. De acordo com o Atlas das Línguas em Perigo da Unesco, são 190 idiomas em risco no Brasil. O país é o segundo com mais línguas em risco no mundo - atrás apenas dos EUA, de acordo com o documento de 2021.
Para conter essa ameaça, o aplicativo foi criado para preservar essas duas línguas em risco. A ideia é frear a perda de transmissão entre gerações e aproximar crianças do idioma por meio de jogos e exercícios interativos.
O nome 'Bilingo' vem de Brazilian Indigenous Languages (Línguas Indígenas Brasileiras) e a iniciativa experimental e sem fins lucrativos, apesar de não ser inédita, tem a pretensão de ser a maior em quantidade de dados armazenados. O trabalho está na fase de testes e ainda não tem prazo de conclusão.
Para Heloisa Helena Siqueira Correia, docente na Universidade Federal de Rondônia (UNIR), ferramentas tecnológicas como essa trazem em si a resistência e a luta dos povos originários. "Demonstra que as comunidades não estão, e nunca estiveram, congeladas no tempo", disse.
“A gente foi perdendo a língua, deixando de falar na língua materna, e isso aconteceu porque muitos não indígenas tinham preconceito. Eles proibiam os indígenas de falar. A língua Makurap era a mais falada nas terras indígenas, e hoje em dia já não é mais”, disse Jéssica Makurap, jovem da comunidade.
Segundo Carolina Aragon, linguista e integrante do projeto, o desenvolvimento do aplicativo em si já é educativo. Isso porque são os próprios jovens indígenas os responsáveis por coletar palavras e áudios da língua materna com os tios, avós e professores, e alimentar a ferramenta digital.
“Quando o jovem pergunta para um tio, avô ou avó como se diz algo na língua e grava essa resposta, ele já está aprendendo, e assim o aplicativo ensina enquanto é construído. Dessa forma, a nossa intenção é fazer com que a língua volte a circular em outros espaços da comunidade, e não apenas dentro da escola”, explica.
O projeto enfrenta desafios práticos, como a dependência de internet para captar e enviar os áudios para os pesquisadores. Além disso, como são os indígenas que alimentam o sistema, o desenvolvimento da ferramenta acompanha o ritmo de vida da comunidade, que envolve estudo, trabalho na roça, caça e pesca.
O APP
O aplicativo funciona de forma semelhante a plataformas de aprendizado de línguas como Duolingo, Busuu e Rosetta Stone. Os usuários seguem uma jornada de aprendizado temática, que inclui seções sobre alfabeto, alimentação, família e outras áreas do cotidiano. Cada seção contém exercícios variados: tradução de palavras do português para a língua indígena; associação de palavras a imagens ou sons; montagem de frases usando palavras disponíveis no exercício.
“Estamos formando o vocabulário certinho, colocando palavras e frases, e a ideia é encher o aplicativo com histórias, mitos e tudo o que faz parte da nossa tradição. Conforme a gente alimenta o aplicativo, a gente também aprende”, afirma a indígena Jéssica.
Gustavo explica que eles também estão desenvolvendo um exercício para praticar a fala. Nele, o usuário pronuncia uma palavra na língua e um modelo de IA indica se a pronúncia está correta. O app ainda terá suporte offline, permitindo o uso em áreas sem internet e garantindo privacidade dos dados, já que as informações ficam sob controle das próprias aldeias.
Fabrício Gerardi, linguista e participante do projeto, destaca que o aplicativo também oferece noções de gramática para adultos que querem compreender melhor o idioma, não apenas para crianças. Com o aumento do interesse de diferentes povos, a ferramenta precisou ser adaptada para realidades variadas, de comunidades que ainda falam a língua no dia a dia a aquelas em que as crianças falam português, mas têm noção do idioma tradicional.
Fonte: DA REPORTAGEM
Veja Mais
Câmara aprova PPA e libera R$ 25 milhões em Sinop
Publicado em 29 de Outubro de 2025 ás 18h 33min
Wellington tem encontro adiado com PL nacional
Publicado em 29 de Outubro de 2025 ás 17h 05min
Cultura apresenta o espetáculo “A Bruxinha que Era Boa” em Lucas
Publicado em 29 de Outubro de 2025 ás 16h 04min
